Excesso de trabalho, falta de horários, precariedade e exaustão foram alguns dos problemas discutidos por jornalistas de órgãos de comunicação nacionais e regionais, na conferência virtual da 6ª edição das Jornadas de Ciberjornalismo.
Ana Isabel Ribeiro (texto)
Fotografia: Guia do Estudante
Têm dinâmicas diferentes e formas de trabalhar diferentes. É difícil encontrar um ponto comum entre jornais nacionais e regionais. Ou pelo menos era. A pandemia funcionou como elemento de ligação. Foi esta a realidade debatida na 6ª edição das Jornadas de Ciberjornalismo - este ano, realizadas online.
De um momento para o outro, as redações, aquele ambiente que a jornalista do Expresso Joana Beleza descreve como uma “oficina gigantesca com teclados, telefonemas, discussões sobre fontes e notícias”, ficaram vazias.
Todos os jornalistas tiveram de ficar em teletrabalho, situação que exigiu um esforço adicional, porque, segundo a própria, grande parte não tinha um portátil em casa onde pudesse trabalhar.
“Ser jornalista num momento como este é extraordinário. Foi um grande momento para o ciberjornalismo o acontecimento desta pandemia”
Para a jornalista, a pandemia acabou por ter mais pontos positivos no que concerne ao jornal Expresso, já que registou um aumento de assinantes online e um decréscimo da publicidade na edição impressa. “Ser jornalista num momento como este é extraordinário. Foi um grande momento para o ciberjornalismo o acontecimento desta pandemia”, assegura.
Para a mesma isso é sinal de que o jornal estava a desprender-se do controlo de órgão externos. “Em abril/ maio sempre que os diretores diziam que ia cair mais uma página, mandávamos emojis felizes, porque era sinal que já não estávamos dependentes da publicidade”, conta.
Ainda assim, os pratos da balança ficaram desequilibrados. Se, por um lado, o jornalismo online passou a ser levado mais a sério, o papel registou uma quebra de vendas razoável. “É mais barato uma assinatura do que comprar o jornal”, afirma. Isto levou o jornal a pensar em apostar mais na produção de conteúdos progressivamente fechados e exclusivos a assinantes.
Durante o primeiro Estado de Emergência, a redação passou a ser a mesma para todos — o WhatsApp— e o contacto passou a ser permanente, dia e noite, porque “Não existe uma cultura de confiança num meio que não se vê”, revela a jornalista.
A trabalhar consecutivamente e sem férias, a pandemia provocou também feridas na saúde mental dos jornalistas.
Os jornais perceberam que é possível fazer jornalismo sem sair de casa, o que teve um custo pessoal acrescido para todos os profissionais do meio. Ainda que, o os diretores se mostrem preocupados com a questão — “As pessoas e o trabalho têm um limite. Isto é um inferno. É um inferno hora a hora e dia a dia”, afirma Joana.
“Em março tivemos um pico de leitores a ler o nosso jornal, foram mais de 300 mil, o que para um jornal regional é muito bom”
Consequência mais agravada em jornais de pequena dimensão que dependem de apoios do público como o Sul Informação, um jornal online da região do Algarve e Alentejo composto por 4 jornalistas que atualizam e criam novos conteúdos diariamente. Neste caso as rotinas pouco ou nada se alteraram. O trabalho não envolvia deslocações diárias à redação e a equipa já estava habituada ao contacto permanente.
Elisabete Rodrigues, uma das jornalistas, destaca a inovação e o crescimento que o jornal apresentou em plena crise pandémica. “Em março tivemos um pico de leitores a ler o nosso jornal, foram mais de 300 mil, o que para um jornal regional é muito bom”, revela.
Este aumento de leitores deveu-se à aposta da equipa na cobertura aprofundada de grandes temas, neste caso a atenção exclusiva que o jornal decidiu dar ao novo coronavírus. “90% da informação, se não mais, tinha a ver com covid. Fizemos uma cobertura sobre outro tema, mas os leitores não gostaram”, adianta.
Segundo a jornalista, o Sul Informação foi mais longe e não ficou à espera que chegasse um comunicado para dar a notícia. Apostou na criação de dois mapas interativos que mostram o número de casos no Algarve e no Baixo Alentejo.
“Se calhar daqui a 2 anos vamos querer olhar para a pandemia com um olhar retrospetivo e publicar artigos sobre ela, mas neste momento, não”
O oposto verificou-se no jornal Divergente, um jornal intendente, que optou por não publicar informação sobre o vírus. “Se calhar daqui a 2 anos vamos querer olhar para a pandemia com um olhar retrospetivo e publicar artigos sobre ela, mas neste momento, não”, explica a jornalista Sofia de Palma.
O que nenhum dos três jornais esconde é a precariedade do meio, que ainda que seja igual para todos, é mais agressiva para a camada mais jovem de jornalistas. “Os mais novos que ganhavam menos e tinham de se deslocar para o Expresso ficaram em casa a trabalhar e o que gastavam nos transportes passou a ser um ganho. A precariedade é um dos grandes problemas da profissão. É isso que vai por em causa a existência do jornalismo”, afiança Joana Beleza.
Segundo Sofia de Palma, é precário e desgastante ao ponto de 40% dos inquiridos admitir pensar em abandonar da profissão e de uma outra percentagem dizer “Vou fazer um esforço para me manter na profissão de jornalista”, revela.
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