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Kamala Harris: O rosto da vice-presidência é feminino

Atualizado: 20 de jan. de 2021

Um século após a aprovação do sufrágio feminino nos Estados Unidos, uma mulher chega a vice-presidente. A história escolheu Kamala Harris, que, além da primeira mulher, é a primeira mulher negra, primeira pessoa de origem indiana e primeira aluna de uma universidade negra a ser eleita para o segundo cargo mais importante dos EUA.

Ana La-Salete Silva (texto)


Fotografia: Saul Loeb / AFP


“A democracia americana não está garantida, é tão forte quanto a nossa vontade de lutar por ela”. São estas as palavras de Kamala Harris no seu discurso de apresentação em Wilmington, no estado do Delaware. Na noite de sábado (madrugada de domingo em Portugal), a vice-presidente eleita subiu ao palco vestida de branco para simbolizar o movimento sufragista e, num discurso de vitória, deu a entender que temáticas como igualdade racial e de género vão fazer claramente parte da sua luta.


Com o final do mandato de Trump, Harris achou por bem relembrar que proteger a democracia “exige luta, exige sacrifício”, mas acrescentou que “há alegria nisso e há progresso porque nós, o povo, temos poder para construir um futuro melhor”. E deixou um agradecimento aos americanos que votaram Biden-Harris: “Quando a nossa própria democracia estava em perigo nesta eleição, com a verdadeira alma da América em causa, e com o mundo a olhar, vocês asseguraram um novo dia para a América.”


Ao colo de quem acreditava


Kamala Harris elogiou o “grande coração” do 46º Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, e aproveitou para falar da sua família – nomeadamente, da mãe, nascida na Índia, que chegou aos EUA com 19 anos: “Ela acreditava tão profundamente na América, onde um momento como este é possível. Por isso, estou a pensar nela e nas gerações de mulheres, mulheres negras, asiáticas, brancas, latinas que na história da nossa nação prepararam o caminho para este momento, hoje. (…) Mulheres que lutaram tanto pela igualdade, liberdade e justiça para todos, incluindo as mulheres negras que muitas vezes, demasiadas vezes, negligenciadas e que tantas vezes provaram que são a espinha dorsal da nossa democracia”

Kamala Harris relembra a “audácia” de Joe Biden em “romper uma das barreiras mais consideráveis” no país e “escolher uma mulher como sua vice-presidente”, mas acredita que chegou onde chegou aos ombros das mulheres que lutaram pelos seus direitos, sejam elas as sufragistas de há um século ou as que foram às urnas este ano.


Nascida em Oakland, Califórnia, a vice-presidente é filha de dois académicos imigrantes – a mãe indiana e o pai jamaicano. A procura por mais pessoas como ela levaram-na a ir estudar para Howard (em Washington D.C.), uma universidade conhecida por ser historicamente negra.


Fez carreira na área de justiça criminal e começou desde cedo a fazer história: tornou-se na primeira mulher e primeira mulher negra a ser procuradora de São Francisco e procuradora-geral da Califórnia. Contudo, a sua posição como procuradora não lhe garantiu grande popularidade entre eleitores negros, que a viam como parte de um sistema conhecido por punir desmedidamente pessoas de cor.


Isso não a impediu, ainda assim, de concorrer para o Senado, em 2017, e ganhar– foi a segunda mulher negra a ser eleita senadora.


Entretanto, bastaram três anos para mais uma conquista: dar, pela primeira vez, um rosto feminino à vice-presidência dos Estados Unidos.


“A representação é importante”


Com a popularidade adquirida por Barack Obama, eleito em 2008, é fácil esquecer que a atual vice-presidente é apenas a segunda pessoa negra a dar a cara pelos EUA – e a abrir caminho para a representatividade.


Numa altura em que o presidente eleito em 2016 usava termos depreciativos em relação a mulheres e imigrantes, nos tempos de Black Lives Matter, surge Kamala: mulher de cor e filha de imigrantes.


No seu discurso, pretendeu acentuar que este marco histórico é, na verdade, uma porta aberta para a oportunidade: “Embora eu possa ser a primeira mulher neste cargo, não serei a última. Porque todas as meninas que estão a assistir hoje percebem que este é um país de possibilidades. E para as pessoas deste país, independentemente do género, a mensagem é clara: sonhem com ambição, liderem com convicção e vejam-se de uma forma que outros podem não ver, simplesmente porque nunca viram antes, mas cá estamos para aplaudi-las a cada passo desse caminho.”


No Halloween, a sobrinha de Harris, Meena, chegou mesmo a publicar no Twitter imagens de uma série de crianças vestidas como ela – de blazer e sapatilhas. “A representação é importante”, legendou.



É de destacar, contudo, que não é apenas o seu rosto que Kamala Harris traz para a mesa no que toca à representatividade: Doug Emhoff, com quem é casada, é o primeiro “vice-marido” e a primeira pessoa judia a fazer parte do grupo constituído pelo Presidente, Vice-presidente e respetivos cônjugues.


Outra novidade para os EUA é a constituição da própria família inter-religiosa. “Momala”, como é carinhosamente apelidada pelas duas enteadas, filhas de Emhoff, é a primeira vice-presidente com uma família não tradicional.


A verdade é que a história de Kamala Harris tem tudo para não ficar por aqui: num país onde muitos vices se tornaram presidentes (como é o caso do próprio Joe Biden), o caminho está aberto para que a primeira "presidenta" da história dos Estados Unidos seja uma mulher de cor.

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